Heloisa
Cristina Rampi Marchioro [2]
O
artigo de Maria Cristina é introdutório, e tem como tema principal falar sobre
a maneira como a Análise de Discurso (AD) trabalha com a noção de língua. Para
tanto, ela descreve conceitos subjacentes ao de língua, organizados no que ela
chama de “Caixa de conceitos”. A autora explica que a AD fundamenta-se por
conceitos como língua, discurso e história e, por isso, busca na linguística,
na teoria do discurso e no materialismo histórico as bases para seu próprio
aparato teórico. E para a noção de sujeito, estuda e questiona a teoria da
subjetividade de natureza psicanalítica, de orientação freudiana/lacaniana.
Da
caixa, ela retira os seguintes conceitos: a história, a ideologia, o sujeito, o
sentido, o discurso. A história, não tida como apenas eventos cronológicos, mas
como historicidade, ou seja, a inscrição da história na língua, como rede de
sentidos. A ideologia, discursivamente falando, é uma prática de sentidos,
estrutura-funcionamento, efeito da relação língua-história. A ideologia
trabalha com a ilusão da evidência, como se tudo já estivesse lá, dito, e com a
ilusão de que o sujeito é origem do seu dizer.
Para
o conceito de sujeito, a autora começa o diferenciando do sujeito da
psicanálise e explicando brevemente sobre as posições-sujeito, sobre como o
sujeito determina e é determinado pelas suas práticas discursivas, dentro das
formações discursivas, e ainda, sobre a interpelação do sujeito pela ideologia.
Os sentidos, por sua vez, se dão pela relação do sujeito com a história, e
nunca estão já-lá, são produzidos pelas práticas discursivas, não sendo nunca
únicos.
A autora fala também
sobre o discurso, objeto da AD, que permite observar as relações da língua com
a ideologia, “bem
como os efeitos do jogo da língua na história e os efeitos desta na língua.”
(p. 193). É por meio do discurso que se pode estudar como um objeto simbólico
faz sentido, e como se constitui o sujeito.
Ao
falar, finalmente, da língua, Maria Cristina situa historicamente os estudos da
AD, desde a seu início até os tempos atuais, lembrando que a grande entrada da
língua para a teoria foi quando Michel Pêcheux introduziu a noção de equívoco,
trazida da psicanálise e deslocada para os estudos do discurso. Ela explica que
para a AD a noção de língua é sua de constituição sendo heterogênea, instável e
contraditória. Esta língua é diferente da do linguista pela sua incompletude,
pelo real, por sua maneira de produzir o equívoco. A língua da AD é relativamente autônoma, é um sistema passível
de perturbações, rupturas, mal-entendidos; não é neutra, sendo o lugar material
da realização dos processos discursivos. A língua do analista de discurso tem
funcionamento ideológico e suas formas materiais estão investidas desse
funcionamento.
Para
explicar como o analista de discurso trata a língua, a autora relembra o
enunciado estudado por M. Pêcheux “on a gagné”, em seu livro Discurso: estrutura ou acontecimento, mostrando
como a materialidade discursiva é opaca, como os sentidos são heterogêneos.
A
autora conclui ainda destacando o trabalho do analista de discurso e o cuidado
que este deve ter em seu gesto analítico.
O
texto é bastante acessível porém, dada a sua brevidade, deixa alguns conceitos
sem exatamente uma definição, como o trazido da psicanálise de “real da língua”
e “real da história”. Para um leitor leigo – ou iniciante – talvez seja difícil
compreender a noção de equívoco, importante para o entendimento desse elemento
que é constitutivo da língua. No mais, é primoroso com as palavras.
[1] Texto resenhado: FERREIRA, Maria Cristina Leandro. “O
caráter singular da língua na análise do discurso”. Organon (UFRGS),
Instituto de Letras/UFRGS, v. 17, n. 35, p. 189-200, 2003
[2] Mestranda do
Programa de Pós-Graduação em Letras, Mestrado em Estudos Linguísticos da Universidade
Federal da Fronteira Sul – UFFS, Campus Seminário, Chapecó – SC.
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