27 de abr. de 2015

O caráter singular da língua na Análise de Discurso[1]



Heloisa Cristina Rampi Marchioro [2]

           
O artigo de Maria Cristina é introdutório, e tem como tema principal falar sobre a maneira como a Análise de Discurso (AD) trabalha com a noção de língua. Para tanto, ela descreve conceitos subjacentes ao de língua, organizados no que ela chama de “Caixa de conceitos”. A autora explica que a AD fundamenta-se por conceitos como língua, discurso e história e, por isso, busca na linguística, na teoria do discurso e no materialismo histórico as bases para seu próprio aparato teórico. E para a noção de sujeito, estuda e questiona a teoria da subjetividade de natureza psicanalítica, de orientação freudiana/lacaniana.
Da caixa, ela retira os seguintes conceitos: a história, a ideologia, o sujeito, o sentido, o discurso. A história, não tida como apenas eventos cronológicos, mas como historicidade, ou seja, a inscrição da história na língua, como rede de sentidos. A ideologia, discursivamente falando, é uma prática de sentidos, estrutura-funcionamento, efeito da relação língua-história. A ideologia trabalha com a ilusão da evidência, como se tudo já estivesse lá, dito, e com a ilusão de que o sujeito é origem do seu dizer.
Para o conceito de sujeito, a autora começa o diferenciando do sujeito da psicanálise e explicando brevemente sobre as posições-sujeito, sobre como o sujeito determina e é determinado pelas suas práticas discursivas, dentro das formações discursivas, e ainda, sobre a interpelação do sujeito pela ideologia. Os sentidos, por sua vez, se dão pela relação do sujeito com a história, e nunca estão já-lá, são produzidos pelas práticas discursivas, não sendo nunca únicos.
A autora fala também sobre o discurso, objeto da AD, que permite observar as relações da língua com a ideologia, “bem como os efeitos do jogo da língua na história e os efeitos desta na língua.” (p. 193). É por meio do discurso que se pode estudar como um objeto simbólico faz sentido, e como se constitui o sujeito.
            Ao falar, finalmente, da língua, Maria Cristina situa historicamente os estudos da AD, desde a seu início até os tempos atuais, lembrando que a grande entrada da língua para a teoria foi quando Michel Pêcheux introduziu a noção de equívoco, trazida da psicanálise e deslocada para os estudos do discurso. Ela explica que para a AD a noção de língua é sua de constituição sendo heterogênea, instável e contraditória. Esta língua é diferente da do linguista pela sua incompletude, pelo real, por sua maneira de produzir o equívoco. A língua da AD é relativamente autônoma, é um sistema passível de perturbações, rupturas, mal-entendidos; não é neutra, sendo o lugar material da realização dos processos discursivos. A língua do analista de discurso tem funcionamento ideológico e suas formas materiais estão investidas desse funcionamento.
            Para explicar como o analista de discurso trata a língua, a autora relembra o enunciado estudado por M. Pêcheux “on a gagné”, em seu livro Discurso: estrutura ou acontecimento, mostrando como a materialidade discursiva é opaca, como os sentidos são heterogêneos.
            A autora conclui ainda destacando o trabalho do analista de discurso e o cuidado que este deve ter em seu gesto analítico.
            O texto é bastante acessível porém, dada a sua brevidade, deixa alguns conceitos sem exatamente uma definição, como o trazido da psicanálise de “real da língua” e “real da história”. Para um leitor leigo – ou iniciante – talvez seja difícil compreender a noção de equívoco, importante para o entendimento desse elemento que é constitutivo da língua. No mais, é primoroso com as palavras.




[1] Texto resenhado: FERREIRA, Maria Cristina Leandro. “O caráter singular da língua na análise do discurso”. Organon (UFRGS), Instituto de Letras/UFRGS, v. 17, n. 35, p. 189-200, 2003
[2] Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Letras, Mestrado em Estudos Linguísticos da Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS, Campus Seminário, Chapecó – SC.

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